terça-feira, 27 de março de 2012

Aquele cálice ainda vazio, transbordando de vinho.



Podia não ter me envolvido,

Ignorado a sua beleza,

Não ter notado as nuances do seu corpo,

Nos movimentos da sua dança.


Podia não ter ouvido as suas palavras de sedução,

Manter trancado este lado esquerdo do peito,

E recusar, quando ela carinhosamente me estendeu a sua mão.


Podia simplesmente ter seguido em frente sem olhar pra trás,

Não ter ousado colocar sentido,

Naquele seu vestido transparente.


Podia não ter me dado conta daquele seu jeito cativo;

Quase um murmúrio de gemido chamando por mim.


Ah, eu podia!

Mas quando ela derramou em seu corpo, aquele cálice ainda vazio,

Insinuando estar transbordando de vinho;

Confesso que me embriaguei de turvar a visão,


Bebi das gotas de todas as partes,

E estas minhas mãos deslizaram, e sopraram no seu corpo,

Como brisa de inspiração,

Que antecede a criação de toda obra de arte.

sábado, 17 de março de 2012

Este tal de Encanto

Quem nunca se encantou?
Isto lhe parece não fazer qualquer sentido?
Afirmo-te: morrestes antes mesmo teres nascido.

Encanto pela vida,
Pelas conquistas.
Até mesmo nas oportunidades perdidas,
Há ai grande sabedoria,
De quem viveu experiências,
Não apenas por um dia.

Encanto é oásis de águas que tu bebes,
E por mais que contradiga,
É estar vivo na vida.

Encanto pelo visto,
E também pelo desconhecido,
Encanto é sentir, chegar sem precisar ir.

Quando o encanto é maior,
Desses que não pode ser controlado,
Pega a tua espada e o cavalo,
E traga pra teu lado a tua amada.

Nunca se encante pelo todo,
Vá bem devagarzinho,
Delicie-se com as partes,
Como pintor que traça cada linha,
Para compor o esplendor da sua obra arte.

Acaso alguém lhe disser,
Que o caminho mais curto entre dois pontos é uma reta,
Ignora os caminhos do corpo de uma mulher.

Se partes dos pés,
E vais em linha reta, direto ao pescoço,
É como pressa, que lhe faz engolir a manga com caroço.

Um encanto não somado a outro é pouco, quase nada,
É tomar chá sem biscoitos, ou mesmo sem torradas.

Ah, esse tal de encanto, constantemente desmitificado,
Por aqueles que não diferenciam um redondo de um quadrado,
Pelos céticos, que se dizem realistas,
Os mesmos que lêm um Best Seller,
Como se desfolhassem as novidades de uma revista.

Encanto sem asas cuidam àqueles que envolvem no peito armadura de couraça.
É coração vencido, de caminho restrito,
Onde até mesmo este está sempre perdido.

Encanto pela menina,
Pelas formas,
Pelo jeito de andar,
De ainda poder, em qualquer idade,
Viver esse dom maior de amar.

Encanto é isso, e tudo mais.
É deslumbrar-se pelo presente,
Com os momentos do passado,
Sem precisar voltar atrás,
É esse caminho sem rumo,
Que nos conduz a todos os tempos,
E nos assegura um futuro pra lembrar.

Encanto por tudo que houver,
Por onde ela anda e pisa,
Um novo encanto todo dia,
Que faz de todos nós poetas,
E encantamos na poesia.

Ah, esse tal de encanto!

sexta-feira, 16 de março de 2012

Um Mestre e seus últimos Discípulos

Conta-se que em tempos passados, estudiosos da filosofia caminhavam junto com aquele que consideravam o mestre maior, o mais sábio de todos. Deixaram todos os afazeres e saíram em uma longa jornada, a fim de descobrir, aprender e viver todas as experiências dos caminhos da vida.



Seu destino final era o mais alto pico da região, onde pretendiam construir um mosteiro, um local de reflexão, ensinamentos e meditação.




Na primeira noite, acamparam na beira de um rio, colhendo frutas da mata para se alimentarem.Veio a segunda noite e encontraram pelo caminho um humilde sítio, onde pediram pousada. O chefe da casa os abrigou no celeiro, mas nada tinha para lhes dar, pois viviam em extrema pobreza, sem a certeza do alimento do dia seguinte.




Dali partiram logo com o clarear do dia, e nada foi dito durante aquela caminhada. Pairava no ar uma grande tristeza em todos pelo desconforto daquela família, e a míngua na qual estavam condenados e fadados a viver.




Na segunda noite, encontraram outro velho sítio, mas desta vez, além da pousada foi- lhes dado algo para comer.Vivia ali um grupo de quatro pessoas e nada mais faziam do que plantar o necessário e tirar vinte litros de leite diários de uma velha vaquinha, os quais vendiam na região, para a compra daquilo que não podiam produzir. Aquela vaquinha era a única e derradeira fonte de renda daquela família, e nada indicava que isso deveria mudar.




Quando veio o amanhecer, o mestre reuniu os seus discípulos e os ordenou que pegassem aquela vaquinha e a entregassem ao dono do sítio da note anterior, para que lhe servisse de alimento, ao menos por algum tempo deveria ser o bastante para o difícil sustento.




Saíram dali, sem que o dono tomasse conhecimento e fizeram o que lhes tinha sido ordenado. Contudo, de volta ao caminho abandonaram o mestre e deixaram que este seguisse sozinho. Não encontraram qualquer justificativa, para aquele que lhes dera pousada e alimento fosse tratado de forma tão injusta.



O mestre seguiu sozinho e se instalou naquele pico mais alto, construindo sozinho a sua moradia. Seu último destino da jornada e objetivo pretendido.




Dois anos se passaram e os discípulos se reuniram novamente. Decidiram que fariam o mesmo caminho e visitariam aqueles sítios, por onde haviam passado.
Grande foi o espanto ao verem no primeiro a grande mudança. Com a vaca que aquele homem recebeu das suas mãos, trocou por dezenas de galinhas poedeiras, e em pouco tempo se tornou o maior fornecedor de ovos de toda a região. O sítio agora ostentava fartura por todos os lados e progredia a cada dia.




Saíram dali felizes e pegaram o caminho que conduzia àquela segunda pousada.
Novamente, constataram grandes mudanças. Aquela família não tendo mais a vaquinha cuidou de conseguir outras formas de sustento, e todos saíram para procurar alternativas de sobrevivência. Com a força do trabalho de todos, logo progrediram. Do velho sítio, construíram uma rica e farta fazenda.




Na noite seguinte os mesmos discípulos se reuniram para avaliar todo o ocorrido, e só ai entenderam a sabedoria daquele que um dia fora deles o grande Mestre. Contudo, mais sábio ainda fora o dono do primeiro sítio, que não havia comido a sua "galinha dos ovos de ouro".

Voltaram aos seus afazeres, pois perceberam que jamais chegariam a Mestres...