sábado, 21 de agosto de 2010

Meu Quarto 3X4


Como todas as noites, eu estava ali no quarto, caminhando de um lado para o outro, sem nem mesmo saber o porquê. Engraçado como a gente faz isso sem perceber, quando os pensamentos viajam para lugares distantes no tempo e no espaço. Era um quarto 3x4, e não tinha muito aonde ir. Andava em círculos, melhor dizendo; em "quadrados”, e por puro hábito de fazer, não batia com a cabeça na parede no fim de cada reta.

Havia uma velha cama bem ali ao lado, e dizem os especialistas que é onde passamos a maior parte das nossas vidas.

Entrava pela porta no mesmo horário de todos os dias. O relógio na cabeceira da cama não me deixava enganar. 20h00min em ponto eu chegava, e só tinha tempo mesmo de ligar a TV pra assistir o telejornal na tela de 14 polegadas.

Na parede lateral uma grande janela 220 x 150, de onde eu via o nascer e o fim de cada dia.
E a minha vida estava assim certinha, toda encaixotada sob medidas.

A porta nunca foi uma saída. Quando o relógio despertava, já quase em cima da hora, eu me apressava no banho pra sair e trabalhar. O portão era o mesmo de sempre. Forçava com o pé direito a base e empurrava pra fora. Com a mão esquerda puxava pra dentro, enquanto que a direita virava a chave. Pronto! Abria. Pra fechar era só dar um empurrãozinho e ele batia barulhento bem atrás de mim. Estava atrasado e não tinha mesmo tempo para esperar.

A vizinha em frente estava sempre lá lavando a calçada, como fazia todos as manhãs. “Que vida chata tinha a minha vizinha”. Pensei; enquanto ela pensava o mesmo de mim.

O ponto do ônibus era como uma família reunida. De longe eu já conhecia as pessoas pelas roupas que usavam. Sandra e Vilma falavam dos novos amigos virtuais da noite anterior. Seu Antônio e dona Esmeralda comentavam das lindas netinhas. Tinha até aquele conquistador barato, de óculos escuros, que olhava pras meninas como se fossem um sorvete de morango.
Eu pouco falava, e nunca estiquei qualquer assunto. Eram sempre os mesmos e sempre cortados, quando finalmente o ônibus se aproximava.

Tinha enfim chegado ao trabalho. “Bom dia, como vai?”. E isso se repetia até o final do corredor. E não importava muito, porque ninguém nunca respondia. Como se a resposta fosse desnecessária. Vez em quando, murmuravam algumas coisas, que eu mal conseguia entender.
Ligava o PC e a tecnologia automática abria a página do trabalho do dia anterior. Era só continuar de onde eu havia parado.

Parada mesmo estava a minha vida!

Toda noite era sempre a mesma rotina de volta para aquele quarto 3x4.

Queria a insegurança, o desconhecido; sem portão com manias, sem as mesmas vizinhas lavando as calçadas, ou os mesmo assuntos do ponto de ônibus. Queria fazer diferente; dizer: “prazer em conhecer!”.
Já estava cansado de não correr riscos. Mas como mudar? Tantos anos naquele quarto me fez acreditar que era o único lugar que existia.

Deitei naquela noite tentando descobrir uma outra porta para abrir.